Claudio Henrique

Nego Besta

Claudio Henrique

# 2


E lá chegou...
Camisa de croché
Branca, lavada
No peito corrente prateada
Calça engomada
Sexta-feira de manhã

Foi como entrou
Num bar de esquina em Santo Cristo
E dizem na rua que foi visto
Numa cervejada
Às seis horas da manhã

Onde contou
Que nunca na vida não quis nada
Trabalhou que nem burro de carga
Mas hoje gozava
O que lhe dera Iansã

E se apresentou
Nasceu e cresceu no Encantado
Morava com a mãe em um sobrado
Na rua criado
Sem pensar no amanhã

Mas o tempo passou
E quando era moço foi soldado
Saiu do quartel revoltado
Trocou o penteado
Por trancinhas Djavan

E assim se deixou levar pelo vício
Na zona de baixo meretrício
Toda noite passou a beber
Até que os amigos do peito
Da sua área
Mostraram pra ele sua falha
“Ô nego, tu precisa vencer
Tua mãe fica te sustentando e não é madame grã-fina
Vê se tu abre teu olho, malandro, vê se acende a tua lamparina”

Assim se empregou
Como estivador no Cais do Porto
No final do dia sempre morto
Mas grana no bolso
Que passou a dar valor

E logo descolou
Um trampo pra tirar um por fora
E comprou um negócio lá na Glória
Com dinheiro agora
Arranjou até um amor

Então se juntou
Teve uma menina e um moleque
No bolso cartão, talão de cheque
E emprego no MEC
Que um compadre lhe arrumou


E a vida mudou
Casa com garagem em Madureira
No pulso, de ouro, uma pulseira
A vida inteira
Com ela ele sonhou

E também comprou
Mais de 20 calças de cor branca
Dez de tergal, dez de elanca
E ninguém lhe arranca
Este ar de vencedor

E assim se deixou levar pelo vício
Lá no Encantado tornou-se difícil
Ver ele bebendo nas tardes de sexta
Até que os amigos do peito da sua área
Mostraram pra ele sua falha
“Ô nego, tu deixa de ser besta
Com essa onda que tu tá tirando a nossa amizade termina
Antes tu era bacana com a gente, hoje olha a gente por cima”

Mas não escutou
Achava que tudo era intriga
De gente que não venceu na vida
Com o rei na barriga
Os amigos desprezou

Mas o tempo mostrou
Que sua política era errada
Sentiu falta dos camaradas
E das bacalhoadas
Que ele sempre organizou

E no final do porre
Quando terminou de contar isso
Tombou no boteco em Santo Cristo
E não teve registro
O vexame que passou

Pois o dono do bar
Jogou ele na rua e disse irado
Só quem faz isso é negro safado
Entra, bebe, desmonta
E não paga a sua conta

E assim se deixou levar pelo vício
De freqüentar o bar em Santo Cristo
Onde toda noite voltou a beber
Aos novos amigos do peito desta área
Diz ser homem que trabalha
Um negro simples, sem muito poder
E até o pessoal do Encantado voltou a ser gente amiga
E se hoje é feliz é porque ele sempre sonhou em ficar bem na vida...

E lá chegou... (volta início)

Compositor: Claudio Henrique Machado de Oliveira (Claudio Henrique Diones)
ECAD: Obra #2311725 Fonograma #1049907

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