Balada de Robert Johnson
Seu mundo era rutilância
Seu mundo era escuridão
Seu nome era Robert Johnson
cantador d'outro Sertão
Vinte e sete anos vividos
lá nos Estados Unidos
passou veloz como a luz
Naquela terra sombria
onde tristeza e poesia
se dava o nome de Blues
Sua mãe teve onze filhos
seu pai ele nunca viu
O mundo em que foi criado
lembrava muito o Brasil
Era neto de escravos
dos negros fortes e bravos
colhedores de algodão
Nunca pisou numa escola
escreveu com a viola
e leu com o coração
Dizem que foi o diabo
quem lhe ensinou a tocar
Em um encontro marcado
numa noite sem luar
Cruzando as estradas tortas
daquelas veredas mortas
chegou na encruzilhada
Veio com a mão vazia
e partiu com melodias
porteio rima e tuá
Outros garantem que é lenda
que o diabo não existe
Johnson só cantava blues
por ser um poeta triste
Impunhava o instrumento
recitava um sentimento
na sua vida andarilha
E a tristeza era uma fera
um cão negro, uma pantera
farejando a sua trilha
Correu estradas de ônibus
de caminhão e de trem
Hora cantando sozinho
hora em dupla com alguém
Andava dias inteiros
ao lados dos companheiros
sobre o sol mais escaldante
Porém sempre se mantinha
vestido com boa linha
bem cuidado e elegante
Buscando um namorada
procurava as mais feiosas
As mulheres solitárias
carentes e carinhosas
A mulher que lhe aceitava
com todo gosto lhe dava
o corpo a casa e a cama
E ele deixava que ela
julgar-se ser a mais bela
na ilusão de quem a ama
Uma noite numa festa
tocava de madrugada
E começou um namoro
com uma mulher casada
Sedutor e seduzido
cantava como um sentido
naquele corpo moreno
Quando um copo alguém lhe deu
ele pegou e bebeu
sem saber que era veneno
Saiu dali carregado
para o quarto da pensão
Morreu e deixou somente
a mala e o violão
Não levou fama nem glória
não deixou nome na história
não levou riso nem mágoa
Foi um sopro de poeira
uma nuvem passageira
um nome escrito na água
Foi assim que Robert Johnson
passou pelo nosso mundo
Brilhou durante alguns anos
e apagou-se num segundo
Não deixou seu nome escrito
no mármore nem no granito
nas armas nem nos brasões
O que deixou para nós
foram os versos e a voz
e vinte e nove canções
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