Estou cansado de ser Vilipendiado, incompreendido e descartado Quem diz que me entende nunca quis saber Aquele menino foi internado numa clínica Dizem que por falta de atenção dos amigos Das lembranças, dos sonhos Que se configuram tristes e inertes Como uma ampulheta imóvel Não se mexe, não se move, não trabalha
E Clarisse está trancada no banheiro E faz marcas no seu corpo Com o seu pequeno canivete Deitada no canto, seus tornozelos sangram E a dor é menor do que parece Quando ela se corta, ela se esquece Que é impossível ter da vida calma e força Viver em dor, o que ninguém entende Tentar ser forte a todo e cada amanhecer
Uma de suas amigas já se foi Quando mais uma ocorrência policial Ninguém me entende, não me olhe assim Com este semblante de bom samaritano Cumprindo o seu dever como se eu fosse doente Como se toda essa dor Fosse diferente, ou inexistente Nada existe pra mim, não tente Você não sabe e não entende E quando os antidepressivos E os calmantes não fazem mais efeito
Clarisse sabe que a loucura está presente E sente a essência estranha do que é a morte Mas esse vazio ela conhece muito bem De quando em quando é um novo tratamento Mas o mundo continua sempre o mesmo O medo de voltar pra casa à noite Os homens que se esfregam nojentos No caminho de ida e volta da escola A falta de esperança e o tormento De saber que nada é justo e pouco é certo De que estamos destruindo o futuro E que a maldade anda sempre aqui por perto A violência e a injustiça que existe Contra todas as meninas e mulheres Um mundo onde a verdade é o avesso E a alegria já não tem mais endereço
Clarisse está trancada no seu quarto Com seus discos e seus livros, seu cansaço Eu sou um pássaro, me trancam na gaiola E esperam que eu cante como antes Eu sou um pássaro, me trancam na gaiola Mas um dia eu consigo resistir E vou voar pelo caminho mais bonito