Ontem desci no ponto ao meio dia Contramão me parecia Na cabeça a mesma reza Deus que não seja hoje o meu dia Faço a prece e o passo aperta Meu corpo é minha pressa Ouviu-se um grito agudo engolido no centro da cidade E na periferia? quantas? quem? O sangue derramado e o corpo no chão Guria
Por ser só mais uma guria Quando a noite virar dia Nem vai dar manchete (nem vai dar manchete) Amanhã a covardia vai ser só mais uma que mede mete, e insulta Vai filho da puta
Painho quis de janta eu Tirou meus trapos, e ali mesmo me comeu De novo a pátria puta me traiu Eu sirvo de cadela no cio
E eu corro Pra onde eu não sei Socorro Sou eu dessa vez
Hoje me peguei fugindo E era breu, o sol tinindo Lá vai a marionete Nada que hoje dê manchete (e ainda se escuta)
A roupa era curta Ela merecia O batom vermelho Porte de vadia Provoca o decote Fere fundo o corte Morte lenta ao ventre forte
Eu às vezes mudo o meu caminho Quando vejo que um homem vem em minha direção Não sei se vem de rosa ou espinho Se é um tapa ou é carinho O bendito ou agressão
E se mudasse esse ponto de vista E o falo fosse a vítima O que o povo ia falar? Trocando, assim, o foco da história Tirando do homem a glória De mandar nesse lugar
Socorro tô num mato sem cachorro Ou eu mato ou eu morro E ninguém vai me julgar
E foda-se se me rasgar a roupa Te arranco o pau com a boca E ainda dou pra tu chupar
Pra ver como é severo o teu veneno Eu faço do mundo pequeno E Deus permita me vingar E Deus permita me vingar E Deus permita me vingar
E eu corro Pra onde eu não sei Socorro Sou eu dessa vez
(citação chico buarque) Morreu na contramão atrapalhando o sábado (pra onde eu não sei) Agonizou no meio do passeio público (sou eu dessa vez) Morreu na contramão como se fosse máquina (pra onde eu não sei) Seus olhos embotados de cimento e tráfego (sou eu dessa vez) Amou daquela vez como se fosse a última
Compositores: Carla Colvara de Sa (Cacau de Sa), Amanda Pacifico Cordeiro (Amanda Pacifico) ECAD: Obra #18996432 Fonograma #17407017