Demorou mas finalmente os Titãs parecem ter reencontrado a fagulha de inspiração que rendeu alguns dos discos mais importantes do rock brasileiro. O recém-lançado "Nheengatu" mostra uma banda renovada, demonstrando prazer em tocar junta mesmo depois de mais de 30 anos e sem metade de sua formação clássica. A nova fase foi notada tanto pelo público, como, especialmente, os críticos, que elogiaram em peso o trabalho - algo que há muito tempo não se via. Para falar sobre o novo trabalho e um pouco de toda essa história, o Vagalume falou com o vocalista, tecladista (e eventual baixista) Sérgio Britto. Confiram os melhores momentos da conversa!
O novo disco é um sucesso de crítica. A recepção positiva surpreendeu ou vocês não ligam para isso?
É verdade, o disco anterior ("Sacos Plásticos" de 2009) foi quase que o oposto desse, foi uma ?unanimidade negativa? (risos), mas acho que temos uma carreira longa e essas coisas acontecem com a gente. Graças a Deus a gente tem ótimos momentos na nossa relação com a crítica... e também momentos péssimos e momentos regulares (risos), mas isso é o reflexo de se ter um trabalho longo que tem altos e baixos como o de todo mundo (com esse tempo de estrada).
Ainda assim, desta vez acho que os elogios foram maiores até que nos nossos discos consagrados. Porque a gente estava lembrando que até o "Cabeça Dinossauro" (1986), que hoje em dia dificilmente alguém não gosta, na época do lançamento não foi tão unânime assim. Logicamente (a recepção) foi muito favorável, mas nesse parece que até um pouco mais (...) eu acho ótimo que isso esteja acontecendo pra gente nessa altura do campeonato.
O disco tem uma sonoridade bem mais pesada do que os últimos álbuns da banda
Sim, pra quem acompanha o nosso trabalho com cuidado, a gente sempre prima pela diversidade, então mesmo num disco como "Sacos Plásticos" tinha algumas coisas pesadas, ácidas... mas nesse a gente decidiu focar em duas coisas: fazer um disco mais cru e com alguma brasilidade. Tanto do ponto de vista musical quanto no das letras.
Foi algo que a gente se propôs a fazer e acho que conseguiu.
Ter quatro pessoas, ao invés de sete ou oito, tomando as decisões e compondo facilita para que o disco saia mais homogêneo?
Não facilita não, até porque cada um de nós se interessa por muita coisa, então é preciso que a gente converse e estabeleça uma baliza estética (...) todas as decisões que tomamos em nossa carreira, mesmo quando éramos oito, foi à custa de muita conversa e discussão. Mesmo na época do "Cabeça..." eu lembro que foi uma coisa difícil a gente chegar à conclusão de que precisava focar e restringir um pouco (as ideias) para que o disco fosse mais eficiente.
Você agora é o integrante com uma carreira solo mais ativa. Quando vai compor já sabe se a música vai ser para a banda ou não?
Eu procuro não fazer essa distinção. Eu escolho escrever sobre um assunto e procuro a melhor maneira de fazer isso. Nesse disco a gente compôs (especialmente) pros Titãs até porque a gente fez muitas coisas juntos. Mas acho que agora o meu trabalho solo tem uma cara totalmente diferente do que o da banda. Foi algo que procurei até para que ele não fosse um produto de sobras.
As letras também parecem refletir o momento atual do Brasil. Elas foram escritas recentemente ou foi um caso de sincronicidade?
Se você pensar bem esses são assuntos que já existem há algum tempo. Não foi na semana passada que aconteceu um caso de racismo (pela primeira vez) ou que descobriu-se que no Brasil existe turismo sexual. Mas esses são assuntos que a gente vem tratando e que dizem respeito à maneira como a gente enxerga o Brasil, lamentavelmente. O conceito do disco tem a ver com aquela história do país que é eternamente do futuro, que nunca se realiza e que não resolve as questões mais básicas. Enfim, esses assuntos todos estavam no ar e a gente foi tratando deles aos poucos, mas sem premeditar.
Mas uma hora, mais pro final do processo, a gente resolveu falar sobre coisas que as pessoas não costumam falar. Por exemplo, "Pedofilia", é uma música que saiu já nessa leva (...) para complementar o leque de assuntos que a gente estava tratando.
Chega ser engraçado porque vários desses casos que o disco parece estar comentando diretamente na verdade estouraram quando as gravações já deviam estar até terminadas.
Com certeza. Por exemplo em "Quem São Os Animais?" (que tem o verso "te chamam de macaco e inventam o teu pecado"), o pessoal acha que tem a ver com o caso do (jogador) Daniel Alves - e essa música acho que tem um ano e meio que eu fiz. Ela estava na leva daquelas dez músicas inéditas que a gente tocou em alguns shows no ano passado.
Vocês também tocaram o "Cabeça Dinossauro" (1986) na íntegra ao vivo recentemente. A retomada de todo aquele repertório influenciou na criação do "Nheengatu" ?
Esse lance da economia quase que minimalista... das letras sintéticas. Aquele negócio de gritar certas coisas em uníssono, que é típica da banda.
Vocês têm vontade de fazer algo semelhante com outro disco?
Essa coisa é um dilema, porque como a gente quer seguir em frente, eu não sei se temos disposição de fazer isso com os outros discos e nem se eles se prestam a isso tão bem quando o "Cabeça..". Porque (nesse álbum) todas as músicas são importantes (...) não tem nada ali para encher linguiça. Acho que no momento é mais fácil a gente tocar todas as músicas do "Nheengatu" do que todas do "Jesus... " ("Jesus Não Tem Dentes No País Dos Banguelas", o álbum de 1987).
A nova turnê já tem data para começar? Já sabe como serão os shows?
A gente está pensando em começar em meados de agosto por São Paulo e Rio. Como fizemos ano passado aquele show ("Titãs Inédito") com dez músicas que estão nesse disco, a gente
pode facilmente tocar o repertório inteiro dele sem muito problema. E nós fatalmente vamos tocar muitas músicas do "Nheengatu" nos shows (...). Ao mesmo tempo tem uma parte do nosso repertório tem que ser com alguns clássicos, porque não dá pro cara ir a um show nosso e não ouvir "Bichos Escrotos", "Polícia"... não tem como.
Mas também queremos pinçar algumas músicas do repertório que estão esquecidas, da mesma forma que fizemos recentemente com "Desordem" (de 1987), que a gente não tocava há muitos anos e tem tido uma recepção ótima. A gente vai procurar outras coisas assim para complementar o repertório para que quem costuma acompanhar a gente tenha uma sensação de frescor.
Ouça "Fardado", a faixa que abre o elogiado "Nheengatu"
O novo disco é um sucesso de crítica. A recepção positiva surpreendeu ou vocês não ligam para isso?
É verdade, o disco anterior ("Sacos Plásticos" de 2009) foi quase que o oposto desse, foi uma ?unanimidade negativa? (risos), mas acho que temos uma carreira longa e essas coisas acontecem com a gente. Graças a Deus a gente tem ótimos momentos na nossa relação com a crítica... e também momentos péssimos e momentos regulares (risos), mas isso é o reflexo de se ter um trabalho longo que tem altos e baixos como o de todo mundo (com esse tempo de estrada).
Ainda assim, desta vez acho que os elogios foram maiores até que nos nossos discos consagrados. Porque a gente estava lembrando que até o "Cabeça Dinossauro" (1986), que hoje em dia dificilmente alguém não gosta, na época do lançamento não foi tão unânime assim. Logicamente (a recepção) foi muito favorável, mas nesse parece que até um pouco mais (...) eu acho ótimo que isso esteja acontecendo pra gente nessa altura do campeonato.
O disco tem uma sonoridade bem mais pesada do que os últimos álbuns da banda
Sim, pra quem acompanha o nosso trabalho com cuidado, a gente sempre prima pela diversidade, então mesmo num disco como "Sacos Plásticos" tinha algumas coisas pesadas, ácidas... mas nesse a gente decidiu focar em duas coisas: fazer um disco mais cru e com alguma brasilidade. Tanto do ponto de vista musical quanto no das letras.
Foi algo que a gente se propôs a fazer e acho que conseguiu.
Ter quatro pessoas, ao invés de sete ou oito, tomando as decisões e compondo facilita para que o disco saia mais homogêneo?
Não facilita não, até porque cada um de nós se interessa por muita coisa, então é preciso que a gente converse e estabeleça uma baliza estética (...) todas as decisões que tomamos em nossa carreira, mesmo quando éramos oito, foi à custa de muita conversa e discussão. Mesmo na época do "Cabeça..." eu lembro que foi uma coisa difícil a gente chegar à conclusão de que precisava focar e restringir um pouco (as ideias) para que o disco fosse mais eficiente.
Você agora é o integrante com uma carreira solo mais ativa. Quando vai compor já sabe se a música vai ser para a banda ou não?
Eu procuro não fazer essa distinção. Eu escolho escrever sobre um assunto e procuro a melhor maneira de fazer isso. Nesse disco a gente compôs (especialmente) pros Titãs até porque a gente fez muitas coisas juntos. Mas acho que agora o meu trabalho solo tem uma cara totalmente diferente do que o da banda. Foi algo que procurei até para que ele não fosse um produto de sobras.
As letras também parecem refletir o momento atual do Brasil. Elas foram escritas recentemente ou foi um caso de sincronicidade?
Se você pensar bem esses são assuntos que já existem há algum tempo. Não foi na semana passada que aconteceu um caso de racismo (pela primeira vez) ou que descobriu-se que no Brasil existe turismo sexual. Mas esses são assuntos que a gente vem tratando e que dizem respeito à maneira como a gente enxerga o Brasil, lamentavelmente. O conceito do disco tem a ver com aquela história do país que é eternamente do futuro, que nunca se realiza e que não resolve as questões mais básicas. Enfim, esses assuntos todos estavam no ar e a gente foi tratando deles aos poucos, mas sem premeditar.
Mas uma hora, mais pro final do processo, a gente resolveu falar sobre coisas que as pessoas não costumam falar. Por exemplo, "Pedofilia", é uma música que saiu já nessa leva (...) para complementar o leque de assuntos que a gente estava tratando.
Chega ser engraçado porque vários desses casos que o disco parece estar comentando diretamente na verdade estouraram quando as gravações já deviam estar até terminadas.
Com certeza. Por exemplo em "Quem São Os Animais?" (que tem o verso "te chamam de macaco e inventam o teu pecado"), o pessoal acha que tem a ver com o caso do (jogador) Daniel Alves - e essa música acho que tem um ano e meio que eu fiz. Ela estava na leva daquelas dez músicas inéditas que a gente tocou em alguns shows no ano passado.
Vocês também tocaram o "Cabeça Dinossauro" (1986) na íntegra ao vivo recentemente. A retomada de todo aquele repertório influenciou na criação do "Nheengatu" ?
DivulgaçãoOs Titãs em 1986
Ele influenciou numa coisa básica, que foi a gente ver que naquele disco conseguimos soluções muito simples e muito eficientes (na execução das músicas) e que na verdade esse era o nosso vocabulário, são as coisas que nos identificam.Esse lance da economia quase que minimalista... das letras sintéticas. Aquele negócio de gritar certas coisas em uníssono, que é típica da banda.
Vocês têm vontade de fazer algo semelhante com outro disco?
Essa coisa é um dilema, porque como a gente quer seguir em frente, eu não sei se temos disposição de fazer isso com os outros discos e nem se eles se prestam a isso tão bem quando o "Cabeça..". Porque (nesse álbum) todas as músicas são importantes (...) não tem nada ali para encher linguiça. Acho que no momento é mais fácil a gente tocar todas as músicas do "Nheengatu" do que todas do "Jesus... " ("Jesus Não Tem Dentes No País Dos Banguelas", o álbum de 1987).
A nova turnê já tem data para começar? Já sabe como serão os shows?
A gente está pensando em começar em meados de agosto por São Paulo e Rio. Como fizemos ano passado aquele show ("Titãs Inédito") com dez músicas que estão nesse disco, a gente
pode facilmente tocar o repertório inteiro dele sem muito problema. E nós fatalmente vamos tocar muitas músicas do "Nheengatu" nos shows (...). Ao mesmo tempo tem uma parte do nosso repertório tem que ser com alguns clássicos, porque não dá pro cara ir a um show nosso e não ouvir "Bichos Escrotos", "Polícia"... não tem como.
Mas também queremos pinçar algumas músicas do repertório que estão esquecidas, da mesma forma que fizemos recentemente com "Desordem" (de 1987), que a gente não tocava há muitos anos e tem tido uma recepção ótima. A gente vai procurar outras coisas assim para complementar o repertório para que quem costuma acompanhar a gente tenha uma sensação de frescor.
Ouça "Fardado", a faixa que abre o elogiado "Nheengatu"