Nobre cardápio crioulo das primitivas jornadas, Nascido nas carreteadas do Rio Grande abarbarado, Por certo nisso inspirado, o xiru velho campeiro Te batizou de "Carreteiro", meu velho arroz com guisado.
Não tem mistério o feitio dessa iguaria bagual, É xarque - arroz - graxa - sal É água pura em quantidade. Meta fogo de verdade na panela cascurrenta. Alho - cebola ou pimenta, isso conforme a vontade.
Não tem luxo - é tudo simples, pra fazer um carreiteiro. Se fica algum "marinheiro" de vereda vem à tona. Bote - se houver - manjerona, que dá um gostito melhor Tapiando o amargo do suor que - às vezes, vem da carona.
Pois em cima desse traste de uso tão abarbarado, É onde se corta o guisado ligeirito - com destreza. Prato rude - com certeza, mas quando ferve em voz rouca Deixa com água na boca a mais dengosa princesa.
Ah! Que saudades eu tenho dos tempos em que tropeava Quando de volta me apeava num fogão rumbeando o cheiro E por ali - tarimbeiro, cansado de bater casco, Me esquecia do churrasco saboreando um carreteiro.
Em quanto pouso cheguei de pingo pelo cabresto, Na falta de outro pretexto indagando algum atalho, Mas sempre ao ver o borralho onde a panela fervia Eu cá comigo dizia: chegou de passar trabalho.
Por isso - meu prato xucro, eu me paro acabrunhado Ao te ver falsificado na cozinha do povoeiro Desvirtuado por dinheiro à tradição gauchesca, Guisado de carne fresca, não é arroz de carreteiro.
Hoje te matam à Mingua, em palácio e restaurante Mas não há quem te suplante, nem que o mundo se derreta, Se és feito em panela preta, servido em prato de lata Bombeando a lua de prata sob a quincha da carreta!
Por isso, quando eu chegar, nalgum fogão do além-vida, Se lá não houver comida já pedi a Deus por consolo, Que junto ao fogão crioulo,
Quando for escurecendo, meu mate -amargo sorvendo, A cavalo nalgum tronco, escute, ao menos, o ronco De um "Carreteiro" fervendo.
Compositor: Jayme Caetano Braun ECAD: Obra #7662182 Fonograma #1895103