Eu conheci João Hortácio muita gente conheceu ! Ele era parte do campo porque o campo era seu... Viveram da mesma sina - quando um precisa outro ajuda - uma simbiose de pampa que só o tempo é que muda. João Hortácio foi campeiro “conhecedor do riscado” fez século nesta terra cuidando o campo e o gado. Sovou pelegos e bastos no lombo destes cavalos viu pingos buenos nascerem e os viu crescer, pra domá-los. Nas suas mãos, muitos laços ganharam armadas pro céu, muito touro se fez boi depois de “afirmá um buléu”. Muita ovelha na tesoura das esquilas de janeiro
teve a folha e a sua perícia comparsando o dia inteiro. Amansador de veiacos entre paciência e pegada arrochou bocal nos queixos frouxou rédeas nas estradas. Foi rastreador de caminhos conhecedor de fronteiras desde onde deitar os arames até as chaves das porteiras. Juntou, na vida por conta, uns pilas, reses e pingos mas deixou irem na estrada pelas folgas de domingo. Amigo de prosas largas e tropas do mesmo porte em cancha tava ou baralho foi um agregado da sorte. Conhecedor dos fundões das cruzadas dos arroios espalhou sua voz nos ventos no eco dos seus aboios. Deixou sua alma no campo nas recorridas que fez sabia o ciclo dos campos
nos olhos de cada rês. Fez açude a mariposas fez lenha pra tanto inverno consertou linha e alambrado que ainda hoje tão no cerno. Fazia cordas pro gasto e algum buçal pra domar que “guentaram” mais que ele sem precisar remendar. Sempre “muy bien” a cavalo - onde cruzava com a vida - criou filhos nos caminhos pra mesma escola da lida. Mas o tempo por senhor no seu destino incomum fez rumos de encruzilhada pra sina de cada um... Sabia os mates jujados e onde apeiar na estrada do gosto da canha branca e do escuro da madrugada. Dos sonhos da moça linda que deixou junto a cancela e que o destino maleva deu outros sonhos pra ela.
O tempo fez dias claros mas também fez temporais e a velhice fez costado pra não soltar nunca mais. Ficou mateando “nas casa” lembrando o tempo da lida e resolveu encilhar sem dar adeus na partida. Esses dias foi embora sem levar nada na mala alguém lhe deu flores brancas, bombacha nova e um pala. Foram poucos que souberam da partida assim tão breve. O tempo apaga nos homens o que vida inteira escreve... Por causa deste descaso tem muito pingo sem freio e boi refugando o laço sem gente pra dar costeio. O campo perdeu querência quase que meia invernada pra não dizer que perdeu-se no rumo da própria estrada. Campeiro, tem campo afora
desses que andam montados mas há pouco João Hortácio pra os campos do nosso Estado. Eu conheci João Hortácio muita gente conheceu... Foi o verso mais campeiro que o meu pago já escreveu!!
Compositores: Mauro Sergio Montenegro Moraes (Mauro Moraes), Paulo Henrique Teixeira de Souza (Gujo Teixeira) ECAD: Obra #2935846